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O álcool de minha avó
*Por Luciano Ornelas Minha avó sempre recomendava após a picada de um inseto: ?Passa álcool?. Tinha aprendido com a mãe dela, minha bisa. O vidro de álcool, hoje de plástico, ficava bem à mão e servia de remédio para um monte de coisas com suas mil e uma utilidades, como essa palha de aço da propaganda. De repente vinha aquela coceira incômoda ou a vermelhidão no braço ou no pescoço ? e dá-lhe álcool líquido. Ardia, mas resolvia. Minha avó conhecia bem as propriedades antibacterianas, antissépticas e desinfetantes do álcool ? e passou a sabedoria à minha mãe, que repassou à minha irmã, que a repassará à filha, que vai explodir e passará para o outro mundo, segundo a Anvisa, que pretende proibir o produto em questão. Mas aí é outra história, como se verá. O álcool canforado, então, era remédio pra tudo. O milagre da solução caseira se fazia ao jogar umas pedrinhas de cânfora no álcool bom, de 96 G/L (92.8 INPM) - não esse gel a 46 G/L, usado para higienizar as mãos em hospitais; tão fraquinho, mas tão fraquinho, que nem fogo acende. Depois, o álcool forte servia para tudo: frieira, dedinho quebrado, galo na cabeça, dor de ouvido, resfriado, mau jeito nas costas. Qualquer coisa era tratada (e quase sempre curada) com álcool canforado. Tiro e queda. Mas o álcool puro, como sabe toda boa dona de casa, é o número um entre os produtos de higiene e limpeza. Não há mancha, qualquer que seja a superfície, que resista ao álcool 96 G/L. Conhecido pela Humanidade há mais de oito mil anos, o álcool é usado em bebidas como cerveja, vinho ou cachaça e na indústria de perfumaria. E, claro, como combustível ? nesse caso, um bem para a natureza, uma fonte de energia renovável, ao contrário dos derivados de petróleo. Evidente que o álcool, como bebida, é um perigo e vale o conselho: moderação. Quando consumido em alta dosagem e por longos períodos, causa a síndrome da dependência (conjunto de sintomas). Sabe-se como se morre de cirrose e outras graves doenças. O alcoolismo nada cura, apenas apressa a caminhada nesta passagem pela Terra. Não é o caso nem devemos misturar usos e costumes entre o álcool caseiro e o das bebidas. O fato é que a Anvisa investe mais uma vez e prega a abolição do álcool 96 /GL para o público. Alega que a garrafa de álcool pode explodir e causar sérios acidentes. Pessoas descuidadas essas que não sabem do alto poder de combustão do produto. Como o leitor sabe bem, notícias de acidentes com álcool são raríssimas: de minha bisa até os dias de hoje, nenhum acidente ocorreu em nosso quintal. A Anvisa deveria ampliar os horizontes de seu interesse, caso queira mesmo proteger a saúde dos brasileiros: poderia começar por recomendar a retirada das portas dos armários de cima das cozinhas - uma topada de cabeça com a quina de uma porta é terrível. Mais ainda a trombada com a quina de uma tampa de mármore da pia no banheiro, uma das causas mais comuns de acidentes domésticos. Banheira, então, maior perigo. Cuidado: tapetes na casa provocam quedas. Então, que se proíbam os tapetes, ou as casas. Pelo menos o quesito ?moradia? seria banido das promessas eleitorais. Medida ainda mais acertada seria proibir a bebida alcoólica no País: o sistema nacional de saúde deixaria de gastar bilhões no tratamento dos bêbados e a sociedade poderia respirar aliviada ao saber que não será mais vítima desses assassinos que, embriagados, assumem um volante e matam sem dó nem piedade. Já que a Lei Seca não resolve, Anvisa neles. O Conselho Nacional de Saúde recomendou a aprovação do Projeto de Lei nº 692/2007, que dispõe sobre restrições do acesso e venda do álcool líquido de uso doméstico. Se o desejo é realmente o de preservar vidas, que se proíbam todos os itens perigosos à venda no varejo. Como facas ou desentupidores domésticos, desses à base de soda cáustica, produto altamente corrosivo, que pode produzir queimaduras, cicatrizes e cegueira. Enfim, o que estranha é o casuísmo da proposta nesse quadro nebuloso da burocracia petista. E em vez do cheiro do álcool, a polêmica exala muito mais um cheiro de lobby. *Luciano Ornelas é jornalista. ...


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